Segunda Gaveta

MARCELA SOUZA - Portifólio

11 de mar. de 2011

"O Pacto", de Jodi Picoult

SINOPSE - Emily Gold e Chris Harte se conheciam desde o primeiro dia de vida. A primeira palavra que Emily disse foi "Chris". A amizade das duas famílias parecia ser das coisas mais sólidas do mundo. Compartilhavam todos os momentos e ninguém se surpreendeu quando os adolescentes Emily e Chris começaram a namorar. Tinham nascido um para o outro. Tudo desmoronou numa madrugada, quando Emily morreu com um tiro na cabeça bem ao lado de Chris, encontrado desmaiado pela polícia. Assassinato? O menino garante que havia um pacto de suicídio entre ele e a namorada. Ambos deveriam ter morrido naquela noite. Alguém falhou. Os pais não conseguem entender de onde nasceu o espírito suicida daquele casal inseparável. Teriam errado na educação deles? Seus filhos teriam dado sinais que não foram capazes de compreender? De um momento para o outro, o mundo sólido de amor, amizade e cumplicidade acabou. A idéia de Chris ter matado Emily afastou não apenas uma família da outra, mas desestruturou os casais. A crise faz rever o passado e pensar um futuro que se sustenta na voz de uma só das partes envolvidas: Chris, cujas palavras serão submetidas ao juízo de um tribunal. Onde está a verdade?
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Falar de história não é fácil. Tentar traduzir ou mesmo simplificar, resumir uma obra, mais difícil ainda. Mas conseguir expressar os sentimentos que uma leitura causam na gente, isso sim, é praticamente impossível.

O Pacto é o primeiro título que li da autora Jodi Picoult. E, em 397 páginas, ela me ganhou.
Picoult é famosa por seus enredos que deixam o leitor sem saber qual partido tomar. São muitas faces de uma mesma moeda, e a gente se apaixona por cada uma delas, a seu modo.

Mais do que qualquer outra coisa, esta obra fala sobre o drama da mente humana e como as emoções e os atos, muitas vezes considerados meros, podem causar feridas e marcas por toda uma vida, podem mudar completamente a direção das existências. Antes de ser um romance, é uma análise do comportamento humano e suas inúmeras faces.

Analisando a obra (e separando a parte do romance), a autora nos traz a tona graves e conhecidos problemas que afligem, principalmente, os jovens. Esse amor tão avassalador, tão incontrolável que eles sempre creem sentir, realmente é forte - se não no sentido meramente sentimental, ao menos no sentido psicológico.

Um ponto interessante deste livro é justamente a relação entre os dois principais personagens, Emily e Chris, não a relação amorosa, mas sim a relação fraternal. Emily tem dúvidas, não sobre o que sente por Chris, pois ela sabe que o ama, mas sim na forma como sente. Há momentos em que ela encherga nele um irmão, chega a pensar que a relação é quase um incesto. Esta também é uma das causas do bloqueio da garota.

Outra questão que considero importante é sobre essa solidariedade mórbida dos adolescentes. Se não dá pra ser feliz juntos, vamos, ao menos, morrer juntos. É tudo tão intenso, tão repleto de adrenalina e tão cruel (e tão imcompreendido, ainda), que eles sentem que os únicos que os entendem são eles mesmo. Não digo que este seja o caso dos protagonistas da história (não literalmente, pelo menos), mas traz essa reflexão também. São tantos os medos nessa fase da vida, que a morte aparentemente lhes cai bem. É aquele período medonho onde já não se sente mais criança e nem sabe-se ainda ser adulto. Uma verdadeira perdição.

Outro ponto relevante é na questão da educação dos filhos. Muitos pais acreditam que conhecem profundamente suas crias, mas não percebem, na maioria das vezes, o que está sob seu nariz. Claro, lembrando que nem sempre as pistas estão sob o nariz. Mas é válido não sair crendo cegamente que se é conhecedor de tudo que se refira aos filhos. A super proteção pode parecer uma fortíssima forma de demonstrar amor e cuidado, quando na verdade é apenas uma falta de confiança própria, uma necessidade de auto afirmação da sua capacidade como mãe/pai.
Em 99% dos casos, o que o jovem precisa é de liberdade, não no sentido de fazer o que quer, mas no sentido de ter a chance de ser ele próprio dentro de sua casa, ao lado de seus pais, de ser livre pra confiar neles e abrir seus corações, expor seus medos e inseguranças. Se os adolescentes tivessem, em casa, mais amigos e menos genitores, talvez muitas "Emilys" do mundo ainda estivessem vivas.

Mas, na minha opinião, o ponto mais forte do livro é justamente o que o torna mais lindo e mais cruel: o amor. Que amor é esse tão grande que te leva a matar e a morrer? No caso de O Pacto, não se trata de crime passional. Se trata, literalmente, de amor - puro e incrivelmente fantástico. É o amor que a "grande verdade do mundo" julga ser o original: amor incondicional, daquele que te fere mortalmente a alma.

Para mim, é platônico. Sim, pois isso independe do outro amar também. É irracional. É burro, estupidamente idiota. Mas é também egoísta, pois uma pessoa que ama tanto o outro só pode desejar que ele a faça feliz, mesmo que seja com a morte, mesmo que faça mal ao outro, simplesmente porque não pode entregar essa dádiva/fardo a mais ninguém.
É vitimado, eu diria. Resumidamente: é suicida, porque aquele que o possui mata a si próprio, corpo e alma, pelo outro, e pior, pelo que o outro acredita que o faz bem, quando nem se sabe se faz mesmo.

Magnífica a descrição do julgamento de Chris Harte. Quando chega nesta parte do livro é quando o leitor não o larga nem para ir ao banheiro. Picoult é deliciosamente detalhista. Além de ter uma capacidade nata de causar uma ansiosidade lacinante no leitor.
Li a terceira parte do livro em pé, andando pelo quarto. Não dá pra ficar parado.
Creio que a autora teve um árduo trabalho de pesquisa e um altíssimo senso de criatividade e inteligência, além de grande delicadeza, para escrever estes trechos finais da obra. É pra deixar qualquer fã de Agatha Christie ou Sidney Sheldon satisfeito.

Enfim, O Pacto é uma história de amor, tragédia e desprendimento. E o final é inimaginável, surpreendente. Traz pro leitor uma outra reflexão: nem tudo é o que parece e, quando é, pode não ser nem um terço de como você pensou que fosse.

Me incomodou demais, me emocionou muito também. Os pequenos detalhes do relacionamento dos personagens, o extremo carinho e cuidado de um, em toda sua maturidade, em contrapartida com a fragilidade do outro em sua personalidade indefesa, são marcas lindíssimas traduzidas por Picoult de maneira muito doce.

"Chris começou uma sutil e destemida campanha para mostrar o que Emily estaria perdendo, se morresse. (...) Amou-a, oferecendo seu corpo com ternura e ansiedade, sem saber qual o melhor jeito de passar para ela pedaços de sua alma para que pudesse remendar a dela".

"A arma escorregou na testa de Emily e ele de repente viu que, se ela se matasse, ele morreria. Talvez não na mesma hora, não com a mesma dor cegante, mas morreria. Não conseguiria viver muito tempo sem coração".

Gosto imensamente quando leio algo que me faz sentir assim, um balde de sensações diferentes e misturadas, que me tira o sono, que me faz pensar. Palavras que me fazem acreditar cada momento em uma coisa. Gosto muito de me tornar próxima dos personagens, de criar afeição por eles e não os esquecer mais.

Super recomendo. Uma leitura pra todas as idades, com uma linguagem fácil, simples, um texto leve e gostoso, as palavras fluem e os cenários se desenvolvem com clareza na mente. Apaixonante e intrigante. Mais uma obra que colocou Jodi Picoult no 1º lugar na lista de best-sellers do The New York Times, e com todo mérito e justiça.

Marcela Souza

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